FILOSOFIA da STOA
As Teses de Zenão e Cleanthes

 

 

 

Alfred Pearson escreve no prefácio de seu The Fragments of Zeno and Cleanthes que “No Neue Jahrbücher für Philologie do ano 1873 Wellman publicou um artigo sobre Zenão de Citium, o qual foi a primeira tentativa séria de discriminar os ensinamentos de Zenão daqueles da Stoa em geral... E a primeira coleção completa dos fragmentos de Zenão e Cleanthes foi feita por Wachsmuth em dois programas da Universidade Göttingen, publicados em 1874-75." [1]

 

 

 

 

 

 

 

 

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A Stoa Poikile

A Galeria das Pinturas [Stoâ Poikîle] no centro de Atenas, é o local de instalação da Stoa filosófica, próximo a 301 a.C., por Zenão de Cítium, um greco-fenício.

A doutrina dos Estóicos, portanto daqueles que ensinam na Galeria, era uma continuação, na Ética, da doutrina de Antisthenes, um severo socrático de três gerações anteriores, que ensinava uma filosofia de austeridade e firmeza de caráter: esta que recebeu o sentido posterior de “estoicismo”.

O jovem Zenão, filho de próspero mercador Fenício, havia chegado a Atenas uns 12 anos antes, se tornando estudante de Filosofia. Como estudante, ele propõe uma síntese que é a Filosofia original da Stoa: na Física e na Lógica, uma nova leitura de platônicos e aristotélicos, e na Moral, a orientação cínica de Antisthenes.

Cleanthes de Assos (na Trôada) era cinco anos mais novo que Zenão, e foi seu discípulo, havendo feito contribuições originais à Stoa, segundo o prof. Pearson. Ao passo em que as sínteses de Zenão resultam de seu esforço lógico sobre os autores, Cleanthes é um filósofo do tipo intuitivo, sendo sincero devoto da ordem dos deuses olímpicos. Sendo poucas as indicações biográficas, ao que parece Cleanthes era homem muito forte e auto-confiante [pugilista]. Após se dedicar a apreender com toda atenção o quadro filosófico que lhe desenhava Zenão, suas teses indicam um regime de estudos dos autores, e meditações contínuas.

Cleanthes foi autor de muitos tratados de física e lógica, incluindo um estudo em 4 volumes sobre Herácleitos [não preservado]. Seu Hino a Zeus é um marco filosófico/teosófico do paganismo. Segundo a tese em Duhot, tanto a tradução grega do Velho Testamento feita pelos sábios hebreus de Alexandria, quanto a mescla doutrinária-lendária dos primeiros cristãos, foram beneficiárias de muitas formas das doutrinas estóicas, de sua teologia, do Hino de Cleanthes, da ética de Epictetos.

Na Introdução de sua Coletânea de fragmentos dos dois fundadores da Stoa, o prof. de Estudos Clássicos de Cambridge A. C. Pearson sustenta que contribuições de inspiração heraclítica de Cleanthes, como a concepção do tonos, não confirmam a imagem de um filósofo de posição secundária. Nas leituras de Pearson, contrariando as leituras eruditas até o séc. XIX (e reassumidas por Arnim e Bréhier no séc. XX) não é Crísipos quem de fato estabelece o "Cânone Estóico". Este cânone seriam as teses de Cleanthes dando acabamento perfeito ao panteísmo dinâmico do iniciador Zenão.

 

FILOSOFIA da STOA -- As Teses de Zenão e Cleanthes

(c) Ciro Moroni Barroso

Lançado no Rio de Janeiro em Agosto de 0019 por:

Editora 7 Letras

 

 

A Coletânea de Alfred Pearson 1891

 

Principais Obras Citadas

1) Pearson, Alfred Chilton, The Fragments of Zeno and Cleanthes – with introduction and explanatory notes, Cambridge Univ. Press, 1891, 344 pags. New York Arno Press, 1973. The Cornell University Library Digital Collections, 2012

archive.org/stream/thefragmentsofze00zenouoft#page/n1/mode/2up

2) Arnim, Hans Von, Stoicorum Veterum Fragmenta, 1903, 1905, Berlim

archive.org/query=Stoicorum Veterum Fragmenta

3) Kury, Diôgenes Laêrtios - Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres, trad. do grego, introd. e notas, Mário da Gama Kury, Edit. Univ. de Brasília, 1987.

4) Hicks, Lives of Eminent Philosophers - Diogenes Laertius, Robert Drew Hicks trans., Harvard Univ. Press. 1972. (First published 1925, Cambridge)

wikisource.org/Lives_of_the_Eminent_Philosophers_Hicks

5) Bett, Sextos Empiricus: Against the Logicians I, II [Ad. M. VII, VIII] Richard Bett trans.& editor, Cambridge Univ. Press, 2005

6) Bréhier, Émile, La Théorie des Incorporels dans l’Ancien Stoïcisme, Lib. Philosophique J. Vrin, [1908, 1928] 1997

7) Long, Anthony, Hellenistic PhilosophyStoics, Epicureans, Sceptics, Univ. California Press, (1974) 1986

8) Long, A.A. & Sedley, D.N., The Hellenistic Philosophers – Vol. I - Translations of the Principal Sources with Philosophical Commentary, 1987

 


Imperador Romano Marco Aurélio, séc. II. Militar e escritor estóico helenizado

 

Alfred Pearson escreve no prefácio de seu The Fragments of Zeno and Cleanthes que “No Neue Jahrbücher für Philologie do ano 1873 Wellman publicou um artigo sobre Zenão de Citium, o qual foi a primeira tentativa séria de discriminar os ensinamentos de Zenão daqueles da Stoa em geral...  E a primeira coleção completa dos fragmentos de [Zenão e] Cleanthes foi feita por Wachsmuth em dois programas da [Univ.] Göttingen, publicados em 1874-75.” [1]

Os Fragmentos de Zenão e Cleanthes do classicista britânico Pearson, por sua vez, foram publicados em 1891. Com estudo introdutório de 53 páginas e comentários escritos em inglês, os fragmentos (na maior parte citações de Diogenes Laércios, Cicero, Stobeos) aparecem nos originais latinos e gregos, sem tradução. [2]


Em 1903, o classicista alemão Hans von Arnim publica os dois últimos volumes de seu Stoicorum Veterum Fragmenta, a coletânea das citações gregas e latinas dos antigos mestres estóicos, incluindo, além de Zenão e Cleanthes, Ariston, Hêrilos, Persaios, Sfairos, Crísipos, e mais alguns sucessores deste último, Diogenes da Babilônia, Antipatros, Apolodoros, etc. Os fragmentos de Crísipos nesta nova coletânea, por serem mais extensos que todos os outros, deveriam ocupar todo o segundo volume (lógica e física) e o terceiro volume (ética e discípulos).

Uma vez que essa era a primeira coletânea completa dos fragmentos de Crísipos, e sendo já disponíveis os fragmentos de Zenão e Cleanthes nas coletâneas de Wachsmuth e Pearson, é compreensível que o primeiro volume da série, relativo a Zenão e Cleanthes (acrescido das citações biográficas), tenha sido lançado somente em 1905.

Em seu compêndio, Von Arnim utiliza somente o latim, e não o alemão, para o prefácio e as notas, sendo estes de ordem literária, e não histórico-filosófica. Seu Prefácio traz referência e reconhecimentos aos estudos de Wellman, Wachsmuth e Pearson.

Havendo Pearson apresentado um estudo sobre a filosofia estóica em sua coletânea dos fragmentos dos fundadores da Stoa, e sendo cada fragmento acompanhado de comentários filológicos e histórico-filosóficos em inglês (e alemão), e uma vez que são apresentadas em latim as coletâneas de Wachsmuth e Arnim, este último com breves comentários das fontes - seria de início necessário perguntar qual a razão para que The Fragments of Zeno and Cleanthes de Pearson tenha sido esquecido, quase nunca sendo citado como referência para o estudo dos fundadores da Stoa - ao passo que o Veterum Stoicorum Fragmenta de Arnim se tornou quase que exclusivamente a fonte de referência - ? [3]


É na Classical Review de dezembro de 1905 que aparece a resenha de Pearson sobre os 3 volumes de von Arnim:

[A obra] é representativa da melhor tradição acadêmica alemã... A coletânea, essencialmente, não é diferente daquela que foi por mim publicada em 1891. O arranjo do material passou por melhorias.
Quase nos parece que todo o cuidadoso escrúpulo por ele devotado na coleta de tudo aquilo que possa ter sido correlacionado a Crísipos tenha resultado de modo desvaforável em sua atitude com relação aos escolarcas anteriores. [4]

Em seguida Pearson apresenta uma sucessão de fragmentos atribuídos a Crísipos os quais, segundo ele, deveriam pertencer à seleção de Zenão. [5]

A observação de Pearson (e as de outros autores a seguir) nos sugere um aspecto crítico não reconhecido, que aparece implícito na importância central que Crísipos recebe como representante de primeira ordem da Escola dos Estóicos, a partir da edição de seus fragmentos por von Arnim. Principalmente a partir dos estudos de Bréhier [6], é comum a muitos estudiosos considerar que:

1) Crísipos de Solis (acme 240 aC), terceiro na sucessão da Stoa, tenha sido um expositor que teria dado continuidade e acabamento definitivo à fundação da Stoa;
2) E que a teoria do lektôn incorporal seria parte desse corpo coerente e histórico unificado - ou que esta estivesse presente desde o início da fundação da Stoa.

Como consequência da ênfase na obra de Crísipos, provavelmente sob a influência das leituras de Bréhier e da coletânea de Arnim, muitos  autores passaram a designar “os Estóicos”, ou a interpretação de suas doutrinas, supondo-se tacitamente as sínteses crisipianas como canônica desta tradição. Todavia, algumas passagens em Diogenes Laércios indicam que Crísipos de Solis teria abandonado a escola dos Estóicos, e se reunido aos seguidores do ceticista Arcesilaos. Insatisfeito com a canônica dos dois patriarcas anteriores, ele teria desenvolvido novas teses, ao procurar absorver, ou superar, o legado pirrônico, ceticista e megárico.

É nesse contexto que podemos considerar a muito referida tese do lektôn [predicação, expressão] enquanto “incorporal”, tese que tem a característica de ser uma contribuição original de Crísipos.

 

Notas

[1] Commentationes I et II Zenone Citiensi et Cleanthe Assio

[2] Pearson baseia seus estudos sobre a Stoa em Zeller, Philosophie der Griechen; em Hirzel, die Entwicklung der Stoischen Philosophie; e em Stein, die Psychologie der Stoa e die Erkenntnistheorie der Stoa, entre outros então recentes autores acadêmicos teutônicos.

[3] Deve se explicar isso pelo desaparecimento físico da obra nas estantes e pelo desinteresse editorial (?). A obra de Arnim passou a ser mais usada como referência – mas isto não deveria afastar o leitor de língua inglesa, p. ex., ao longo dos anos 10, 20, 30.

Jean Brun, em Le Stoïcisme, PUF, 1958, Paris (O Estoicismo, ed. 70, 1986, Lisboa) menciona os “instrumentos fundamentais” para o estudo da Stoa: Pearson; von Arnim; Herman Diels (Doxographi Graeci, Berlim, 1879); e C. Vogel (Greek Philosophy, a collection of textes with notes and explanation, vol. III, Leiden, 1959)

O inglês Anthony Long (1986, pag. 254) apresenta a edição dos fragmentos de von Arnim na bibliografia estóica, considerando-a a “coletânea padrão da evidência para o antigo estoicismo (de Zenão a Antipatros)”, sem no entanto fazer a mínima menção a Pearson e à sua coletânea. Long sugere que a obra de Arnim "está atualmente carecendo de revisão. Parte do material que Arnim incluiu é de validade duvidosa para o estabelecimento das concepções de Crísipos, e alguns autores, especialmente Cícero e Sêneca, estão mal representados".

A Bibliothèque de la Pléiade lançou em 1962 o volume Les Stoïciens, uma coletânea organizada e traduzida por Émile Bréhier, e que foi editada e terminada por P.-Maxime Schuhl, Aubenque e Goldsmith. A coletânea inclui 1.500 pags. de textos estóicos, onde eles existem como originais completos (o Hino de Cleanthes, Sêneca, Epictetus, Marco Aurélio), ou como comentários (Cícero, Diog. L.).

[4] “It almost seems as if the scrupulousness with which he has been at pains to gather in everything which might have been connected to Chrysippus has reacted unfavourably on his attitude towards the earlier scholars.” The Classical Review, vol. 19, no 9 (December 1905), Oxford Univ. Press.

[5] O sub-título nos vols. II e III já o denota: Chrysippi Placita– cum generali stoicorum doctrina composita

[6] Os dois estudos de Émile Bréhier sobre a teoria dos incorporais e Crísipos são originalmente de 1908 [1928] e 1910 [1951]. Em La Théorie des Incorporels, p.3, aponta Crísipos como “le représentant le plus consideráble de l’ancien stoïcisme”. E Long & Sedley: “’early stoicism’ means for us, in effect, the philosophy of Chrysippus” (p. 3).